segunda-feira, 7 de maio de 2007

Reforma Política

Plataforma dos movimentos sociais para a
Reforma do Sistema Político no Brasil
SÍNTESE[1]

APRESENTAÇÃO

O documento “Plataforma da Reforma do Sistema Político” foi construído a partir de debates realizados por pessoas, organizações, redes e movimentos de todo Brasil em âmbitos locais, estaduais, regionais e em um seminário nacional, que reuniu representações de todos os estados brasileiros em São Paulo em novembro de 2006.
Em constante construção, a Plataforma é fruto deste processo e não quer sinalizar que estamos finalizando os debates, mas sim sistematizando os acúmulos que tivemos até o presente momento.
Neste sentido, continua em construção e quer dialogar com as diversas iniciativas que tratam deste tema, principalmente com o Congresso Nacional, espaço em que se vai aprovar a reforma política.
O presente documento é um resumo desta Plataforma, que tem como objetivo introduzir o debate e as questões que estão em jogo na disputa por uma reforma política ampla, democrática e participativa.

EM QUESTÃO, UMA OUTRA REFORMA POLÍTICA

A reforma política, em que pese os distintos momentos do debate tanto no Congresso, quanto no Governo Federal como na mídia, tem um marco comum: a ênfase - quando não a redução exclusiva do debate - numa reforma da legislação eleitoral e dos partidos.

A construção de uma sociedade democrática, no entanto, está inserida em um contexto mais amplo, que diz respeito a mudanças no próprio sistema político, na cultura política e no próprio Estado. As constatações de que os objetivos da Carta Constitucional não têm sido alcançados plenamente e de que seus avanços caminham a passos curtos se convertem em incentivos à mobilização a fim de aprimorar as regras do sistema político.

É para reivindicar esta “outra reforma” que movimentos sociais, redes, fóruns e Organizações Não Governamentais - à frente delas o Fórum Nacional de Participação Popular - vêm construindo, desde 2005, uma proposta de Reforma Política para o Brasil. Esse documento, denominado Plataforma exige uma reforma ampla que expanda a democracia em cinco diferentes eixos: I. Fortalecimento da democracia direta, II. Fortalecimento da democracia participativa, III. Aprimoramento da democracia representativa: sistema eleitoral e partidos políticos, IV. Democratização da informação e da comunicação e IV. Transparência no poder judiciário.

Em relação à democracia direta, é imprescindível a definição de uma nova regulamentação das formas de manifestação da soberania popular expressas na Constituição Federal (plebiscito, referendo e iniciativa popular). A atual não só restringe a participação, como a dificulta. A ampliação das regras sobre plebiscito e referendo é necessária para que a participação popular nas decisões políticas seja efetiva e não meramente simbólica.

Os inúmeros espaços de participação, em especial os Conselhos de políticas e as Conferências não dialogam entre si e muito menos tencionam o atual sistema político representativo. A participação popular nesses espaços é majoritariamente uma participação consultiva, setorializada, reproduzindo a fragmentação existente nas políticas públicas e o distanciamento das decisões econômicas referente à alocação de recursos públicos. Para o aperfeiçoamento da democracia participativa, acreditamos ser necessário construir um sistema integrado de participação popular.

Apesar de defendermos que a reforma política diz respeito não somente aos processos eleitorais ou aos partidos, mas sim a todos os processos decisórios, portanto, de poder, entendemos como necessário o aperfeiçoamento da democracia representativa, que implica mudanças no sistema eleitoral e partidário, possibilitando acesso igualitário a homens e mulheres à representação popular no poder legislativo e executivo.

É preciso afirmar também que sociedade e comunicação democráticas são indissociáveis. Pertencem ao mesmo universo e sua relação não pode ser dissolvida. Se a comunicação exerce um papel fundamental para a realização plena da cidadania e da democracia brasileira, a democratização da comunicação representa condição fundamental para o efetivo exercício da soberania popular.

O Poder Judiciário é o poder que a população tem mais dificuldades em acessar. Os profissionais do Poder Judiciário são concursados ou exercem cargos de confiança. Não estão sujeitos a nenhum tipo de controle social ou participação da população, Por isso, precisamos construir mecanismos de participação e controle social sobre o Poder Judiciário, para que cumpra o papel regulador das relações sociais, econômicas e políticas.

Também é foco dessa plataforma o respeito às diversidades, garantindo voz e poder político a grandes parcelas da sociedade brasileira que sempre foram excluídas pela desigualdade econômica e social, pela violência e pela mídia conservadora e reprodutora do sistema opressor e excludente, a exemplo de negros(as), mulheres e povos indígenas.

Sem negar a necessidade de um Estado eficiente na defesa do interesse público e com ampla participação popular, essa plataforma se opõe necessariamente ao paradigma do Estado mínimo. Opõe-se também às formas tradicionais de fazer política, na medida em que propõe uma reforma política que radicalize a democracia, que enfrente as desigualdades e a exclusão, que promova a diversidade e a participação cidadã. Uma reforma que amplie as possibilidades de setores excluídos do poder, enfim, de todos/as os/as despossuídos/as de direitos.

A Plataforma para uma Reforma Política para o Brasil, com os cinco eixos de ação, circulou o país em seminários e encontros regionais para ampla consulta e debate nacional em redes, fóruns, movimentos sociais, populares e sindicais. Sua versão completa se encontra na página www.participacaopopular.org.br.

Nossa intenção agora é de que os resultados deste ciclo de debates - consolidados neste documento - subsidie o novo Congresso Nacional e à sociedade no debate sobre a reforma política e sejam considerados num processo que responda de fato ao interesse público.

CONCEPÇÃO, OBJETIVOS E PRINCÍPIOS

Democracia é muito mais que o direito de votar e ser votado. É preciso democratizar a vida social, as relações entre homens e mulheres, crianças e adultos, jovens e idosos, na vida privada e na esfera pública, as relações de poder no âmbito da sociedade civil. Portanto, é mais que apenas um sistema político formal e a relação entre Estado e sociedade. É também a forma como as pessoas se relacionam e se organizam. A Reforma Política que defendemos visa radicalizar a democracia para enfrentar as desigualdades e a exclusão, promover a diversidade, fomentar a participação cidadã.
Isto significa uma reforma que amplie as possibilidades de participação política, capaz de incluir e processar os projetos de transformação social que segmentos historicamente excluídos dos espaços de poder, como mulheres, afro descendentes, homossexuais, indígenas, jovens, pessoas com deficiência, idosos e despossuídos de direitos de uma maneira geral trazem para o debate público.
Não queremos a “inclusão” nesta ordem que aí está. Queremos mudar esta ordem. E a Reforma do Sistema Político é um elemento-chave na crítica às relações que estruturam este sistema.
Por isso, defendemos uma reforma que promova uma real transformação no quadro de elementos estruturantes do atual sistema político brasileiro, como: patriarcado, patrimonialismo, oligarquia, nepotismo, clientelismo, personalismo e corrupção.
Esta transformação deve estar alicerçada nos princípios de igualdade, diversidade, justiça, liberdade, participação, transparência e controle social.

RESUMO DAS PROPOSTAS

EIXO 1
FORTALECIMENTO DA DEMOCRACIA DIRETA

Regulamentação e ampliação dos mecanismos de democracia direta previstos na Constituição Federal: plebiscitos, referendos e iniciativa popular;
Instituição - nos estados e municípios – de mecanismos de aplicação dos instrumentos de plebiscito, referendos e iniciativa popular;
Realização de plebiscitos e referendos para acordos internacionais;
Realização de plebiscitos e referendos para emissão de títulos públicos, privatizações e terceirizações dos serviços púbicos essenciais;
Criação de uma política de financiamento público e de controle das doações privadas nas campanhas de formação de opinião nos processos de referendos e plebiscitos;
Construção de uma política pública de educação para a cidadania, oferecendo condições para que a sociedade possa influir efetivamente sobre as políticas públicas;
Revogação popular de mandatos eletivos tanto no executivo quanto no legislativo;
Realização de referendo sobre a Reforma Política aprovada pelo Congresso Nacional;
Direito a recorrer ao Poder Judiciário para que o Estado use os mecanismos de democracia direta.

EIXO 2
FORTALECIMENTO DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

Participação da sociedade na definição das prioridades de pauta do Congresso Nacional e demais Câmaras legislativas;
Criação de mecanismos de participação, deliberação e controle social das políticas econômicas e de desenvolvimento:
- criação de mecanismos de participação e controle social nas decisões do Banco Central, CMN – Conselho Monetário Nacional e no COFIEX - Comissão de Financiamento Externo;
- estabelecimentos de mecanismos de diálogo desde a realidade local para a aplicação de recursos pára-fiscais (recursos públicos que estão fora do orçamento federal) administrados pelo BNDES, Caixa-Econômica, Banco do Brasil, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia;
Criação de mecanismos de participação e de controle social do ciclo orçamentário (formulação/definição, execução, avaliação/monitoramento e revisão) nos âmbitos da União, estados e municípios (poder executivo);
Reformulação das Regras de Tramitação do Orçamento no Poder Legislativo: fim das emendas individuais dos parlamentares;
Acesso universal às informações orçamentárias na União, estados e municípios;
Continuidade de planos e programas das políticas publicas deliberados no âmbito de conselhos e conferências, que tenham comprovada a sua efetividade;
Estabelecimento de princípios gerais para nortear a criação de todos os conselhos de políticas públicas;
Criação de mecanismos de dialogo e de interlocução dos diferentes espaços de participação e controle social.

EIXO 3
APRIMORAMENTO DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA: SISTEMA ELEITORAL E PARTIDOS POLÍTICOS

Financiamento público exclusivo de campanhas;
Manutenção dos partidos políticos exclusivamente através de contribuições de filiados, definidas em convenções partidárias, e dos fundos partidários;
Destinação do tempo de propaganda partidária para ações afirmativas;
Uso de recursos do fundo partidário para a educação política e ações afirmativas;
Implantação da Fidelidade Partidária;
Voto de legenda em listas partidárias preordenadas;
Possibilidade de criação de federações partidárias;
Fim da cláusula de barreira;
Prazo de filiação de um ano antes da realização da eleição ou dois anos, caso já tenha sido filiado a outro partido;
Fim da reeleição para todos os cargos executivos com ampliação dos mandatos;
Limites de dois mandatos eletivos consecutivos;
Proibição de o/a candidato/a disputar novas eleições antes do término do mandato para o qual foi eleito, tanto no executivo como no legislativo;
Indicação do nome do Suplente de Senador/a conste da cédula eleitoral (urna eletrônica) e que seja submetido a voto;
Fim das votações secretas nos legislativos, em qualquer caso;
Fim da imunidade parlamentar a não ser exclusivamente ao direito de opinião e denúncia;
Fim do direito a foro privilegiado a não ser no que se refere ao estrito exercício do mandato ou do cargo;
Organização dos debates eleitorais pela Justiça Eleitoral e transmissão facultada aos meios de comunicação;
Fim da publicação de pesquisas às vésperas do pleito (prazo de uma semana antes das eleições para veiculação);
Proibição de contratação de cabos eleitorais nas campanhas;
Fim do Nepotismo direto ou cruzado em todo o setor público, e sua classificação como crime no Código Penal;
Fim do sigilo bancário, patrimonial e fiscal de candidatos/as, representantes e ocupantes de altos cargos dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público;
Proibição de que detentores de mandatos e familiares mantenham vínculos administrativos de direção ou de propriedade com entidades ou empresas que prestem serviços ao Estado, sob pena de perda de mandato;
Exigência de concursos públicos para preenchimento de cargos públicos nos três poderes, delimitando claramente os cargos de confiança;
Exigência de concurso público para a escolha dos ministros dos Tribunais de Contas;
Criação, com participação da sociedade civil, de Conselho Nacional de regulamentação do processo eleitoral, tirando este poder do TSE;
Criação de órgão executivo eleitoral independente;
Criação de órgão fiscalizador do processo eleitoral composto pelos Partidos e organizações da sociedade civil, com dotação orçamentária própria;
Manutenção do TSE com a função judiciária. Que seus juízes não sejam os mesmos de instâncias superiores, para evitar que recursos contra suas decisões voltem a cair nas suas próprias mãos ou nas mãos de seus pares;
Estabelecimento de cotas específicas para representantes indígenas nos legislativos federal, estaduais e municipais; estabelecimento de regras próprias adequadas à realidade sociocultural dos povos indígenas.

EIXO 4
DEMOCRATIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO

Criação do Sistema Público de comunicação conforme prevê o Art. 223 da Constituição Federal de 1988, complementarmente aos sistemas privado e estatal;
Incentivo aos mecanismos de controle público sobre os meios de comunicação;
Valorização das rádios e TVs comunitárias;
Isonomia e fiscalização de propagandas oficiais pagas em meios de comunicação privados;
Criação de política publica de incentivo ao uso de software livre e o livre acesso à banda larga via radiofreqüência;
Direito de antena para as organizações da sociedade civil.

EIXO 5
TRANSPARÊNCIA NO PODER JUDICIÁRIO

Exigência de concursos públicos para acesso as funções/cargos do Poder Judiciário;
Fim do STF (Supremo Tribunal Federal) e criação de um Tribunal Constitucional como única instância acima do Superior Tribunal de Justiça;
Obrigatoriedade de criação de Defensorias públicas municipais;
Criação de corregedorias populares com a participação da sociedade civil para avaliar e fiscalizar a ação do poder judiciário;
Demissão de Juizes/as e promotores/as quando comprovado caso de corrupção, venda de sentenças, tráfico de influências ou vínculo com grupos criminosos;
Criação e/ou ampliação dos sistemas de informação do Judiciário.

ORGANIZAÇÕES PARTICIPANTES

Participaram do processo de construção da plataforma as seguintes organizações, redes e movimentos reunidos hoje na Mobilização por uma Reforma Política ampla, democrática e participativa:

ABONG (Associação Brasileira de ONGs)
AMB (Articulação de Mulheres Brasileiras)
AMNB (Articulação de Mulheres Negras Brasileiras)
ACB – (Associação dos cartunistas do Brasil)
Campanha Nacional pela Educação
CEAAL (Conselho Latino Americano de Educação)
CNLB (Conselho Nacional do Laicato do Brasil)
Comitê da escola de governo de São Paulo da Campanha em defesa da República e da Democracia
FAOC (Fórum da Amazônia Ocidental)
FAOR (Fórum da Amazônia Oriental)
FBO (Fórum Brasil do Orçamento)
FES (Fundação Friedrich Ebert)
Fórum Mineiro pela Reforma Política Ampla, Democrática e Participativa
Fórum de Reflexão Política
FNPP (Fórum Nacional de Participação Popular)
FNRU (Fórum Nacional da Reforma Urbana)
Inter-redes - Direitos e Política
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Movimento pró-reforma política com participação popular
MNDH (Movimento Nacional de Direitos Humanos)
Observatório da Cidadania
PAD (Processo de Diálogo e Articulação de Agências Ecumênicas e Organizações Brasileiras)
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
REBRIP (Rede Brasileira pela Integração dos Povos)
Rede Feminista de Saúde

* cada rede/fórum/movimento reúne em suas bases centenas de grupos e organizações.
[1] - Os originais da Plataforma estão disponíveis em www.participaçãopopular.org.br

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