sexta-feira, 28 de junho de 2013

URGÊNCIA DA REFORMA POLÍTICA


                                                                                                                               D. Demétrio Valentini
 

Do clamor das ruas emerge, com nitidez, uma providência que precisa ser assumida de imediato. Trata-se de efetivar a tão esperada reforma política, que reaproxime Estado e Sociedade, e que possibilite mecanismos de participação popular, para que as demandas do povo possam ter o seu encaminhamento normatizado, de modo claro e prático.
Se a reforma não viabilizar o exercício da democracia direta, o impasse se reproduzirá. O recado mais direto das manifestações populares é a salutar vontade do povo, de participar das decisões que dizem respeito aos interesses de toda a população, sem privilégios e sem exclusões.
O cerne da reforma política a ser efetivada com urgência, e com a força decorrente das demonstrações populares, precisa ter como foco central viabilizar o exercício da democracia direta.
Este exercício é duplamente viável. Em primeiro lugar, porque existem hoje os meios técnicos da aferir a vontade do povo, possibilitando que os cidadãos manifestem suas demandas.
          Em segundo lugar, porque o povo expressou sua consciência política e sua vontade de participar das responsabilidades públicas em vista do bem comum de toda a sociedade.
          Portanto, o passo qualitativo a ser dado deve ser o aprimoramento da democracia participativa, para não reincidir nas desgastadas fórmulas da democracia representativa.
         E no que se refere à legislação eleitoral, o ponto central é o financiamento das campanhas, que precisa ser bem regulamentado, sobretudo para que o poder econômico não seja o fator determinante dos resultados eleitorais.
A reforma política tem a finalidade de reaproximar o poder político do nascedouro de onde ele procede, que é a cidadania. A Constituição afirma muito claramente que “todo poder emana do povo, e em seu nome é exercido”.  A Sociedade, que delega o poder ao Estado, não pode simplesmente achar que o Estado vai sempre exercer este poder dentro das finalidades que lhe foram atribuídas. Ela precisa sempre sustentar as estruturas, e as motivações, para que o poder seja exercido de acordo com as finalidades que devem regê-lo.
Uma reforma política, portanto, se apresenta claramente com a finalidade de atingir o âmago da estrutura do poder e a forma de exercê-lo, tendo como critério básico inspirador a participação popular. Trata-se de reaproximar o poder e colocá-lo ao alcance da influência viável e eficaz da cidadania. Em outras palavras, trata-se de tomar providências e medidas práticas, para redemocratizar as relações entre Estado e Sociedade, possibilitando a consecução das finalidades inscritas na Constituição, atendendo ao anseio de aperfeiçoamento e consolidação da democracia, que favoreça o bem comum de toda a população brasileira.
        Será um bom teste de maturidade política chegarmos à aprovação das propostas concretas capazes de traduzir na prática estes princípios.
        Para a hipótese de que seja escolhido o caminho do plebiscito, já fará parte do processo democrático a elaboração das questões, claras e objetivas, a serem submetidas à decisão do povo. Seja como for, é preciso traduzir os anseios do povo em medidas concretas, a serem decididas e assumidas responsavelmente por todos.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Falso debate sobre a PEC 37

Por Paulo Moreira Leite
Desde janeiro de 2013, é diretor da ISTOÉ em Brasília. Dirigiu a Época e foi redator chefe da VEJA, correspondente em Paris e em Washington. É autor dos livros A Mulher que era o General da Casa e O Outro Lado do Mensalão.
 
SGeral: publicado em 23/06/2013
 
O debate em torno da PEC 37 ocorre num momento especialmente instrutivo para quem se preocupa com a preservação das instituições democráticas.
 
         A PEC, nós sabemos, pretende garantir exclusividade às forças policiais no trabalho de investigação criminal.
         Só para você ter uma ideia do que está acontecendo.
         Dias atrás, tivemos um mutirão de 158 promotores. Os jornais e emissoras de TV disseram que sua finalidade era combater a corrupção. O próprio Roberto Gurgel, procurador-geral da República, deu um esclarecimento em outra linha: "O MP está mobilizando a sociedade no sentido de mostrar que o que se deseja com a PEC 37 é concentrar as investigações num único órgão do Estado, a Polícia. É um retrocesso gigantesco para a persecução penal e para o combate à corrupção.”
        É grotesco.
        O procurador-geral admite que o Ministério Público fez prisões e operações de busca com a finalidade de fazer propaganda de um ponto de vista político e pressionar o Congresso. O Estado de S. Paulo, o mais antigo dos grandes jornais do país, diz que é isso mesmo – e critica Gurgel, em editorial. “Se fosse apenas uma demonstração de eficiência dos Ministérios Públicos (MPs) estaduais e da Procuradoria-Geral da República no cumprimento de suas atribuições funcionais, o mutirão contra a corrupção - integrado por 158 promotores - mereceria aplauso. Infelizmente, porém, ele foi realizado com propósitos corporativos e políticos.” 
        Disse ainda o jornal: “Mais do que um ato de protesto, essas operações midiáticas são uma verdadeira tentativa de retaliação contra políticos, por parte do MP.” É isso, meus amigos: “uma tentativa de retaliação contra políticos.” Quem quer retaliar os políticos? Até onde eu sei, quem faz isso é o eleitor, em urna. Retalia quem não gosta, promove quem agrada e dá uma chance a quem levanta esperanças. Fazemos isso pelo voto em urna, soberano, origem dos poderes da nação. 
É assim nas democracias, o pior regime que existe com exceção de todos os outros. 
        Vamos pensar um pouco mais. Nesta operação exemplar, tivemos dezenas de prisões, operações de busca, e até dois parlamentares paulistas com seus telefones grampeados, em algo que é uma campanha marketing. Não se iluda. Em poucos dias, o saldo dessa operação de “demonstração” estará nos jornais, um punhado de políticos será acusado a partir de informações vazadas e o país estará estarrecido diante de mais um escândalo.
        Sei que a corrupção existe e que é preciso que seja punida e investigada.  Mas a perseguição política não leva a parte alguma. Seleciona alvos, define adversários e escolhe suas vítimas ao sabor de opções que não têm caráter técnico. Só para dar um exemplo, que todos podem lembrar: não é curioso que o celebre mensalão mineiro, pioneiro e original, iniciado nas eleições de 1998, só tenha sido investigado anos depois que se apurou o mensalão petista? E não é curioso que até ministros admitem que o interesse da imprensa – uma instituição privada, com interesses próprios e visão política própria – tenha interferido nesse comportamento? Não se deve generalizar uma discussão que não tem mocinhos nem bandidos, mas é preciso entender o principal: estamos assistindo a uma disputa de garantias constitucionais e direitos democráticos. Este é o debate em torno da PEC 37.
        Não sou em quem diz isso, mas a seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, que acaba de criar uma Comissão de Defesa da Constitucionalidade das Investigações Criminais. Procurando esclarecer as coisas, o advogado Marcos Costa, presidente da OAB-São Paulo apoia a PEC 37 e explica, em entrevista ao Estado de S. Paulo de hoje: "A PEC não quer restringir os poderes do Ministério Público, cujo papel é relevantíssimo e está claramente estabelecido pela Constituição Federal de 88. Na verdade, propõe restabelecer a imparcialidade na fase de investigação, segundo a qual a Polícia Judiciária (Civil e Federal) investiga, o Ministério Público denuncia, a Advocacia faz a defesa e o Judiciário julga." Para Costa, "quem acusa não pode comandar a investigação, porque isso compromete a isenção, quebra o equilíbrio entre as partes da ação penal".
        A PEC 37 devolve à polícia o direito de investigar uma denúncia criminal. Já ao Ministério Público caberia  determinar a abertura de uma investigação e apresentar uma denúncia à Justiça, se for o caso. Por quê? Como ensina o mesmo Estadão: “No Estado de Direito, quem acusa não deve ter a prerrogativa de investigar, sob pena de se pôr em risco o devido processo legal e ferir liberdades públicas e individuais.”